História Obscura | 5. A Questão de Olivença: o sabor amargo da Guerra das Laranjas
Se ouviram o episódio 5 do História Obscura, já sabem tudo sobre laranjas, guerras, a disputa de Olivença e mais um par de botas.
Mas e sobre D. Maria I? A primeira rainha reinante de Portugal (ou seja, rainha que não era apenas mulher de um rei) era uma amante da paz, uma devota da igreja católica, uma empreendedora de obras sociais, e era também completamente varrida do juízo. Da moleirinha. Ou para usar um termo técnico, não jogava com o baralho todo.
Ou pelo menos, foi assim que ficou conhecida, não fossem os seus dois cognomes "A Piedosa", por um lado, e "A Louca" por outro. E que loucura era esta? Bom, reza a história que a rainha era principalmente acometida por fortes ataques de "melancolia".
Não sabemos de que sofria Maria I ao certo, e talvez hoje fosse mais claro se estaria em causa uma doença mental com cura à vista. Maria tinha também problemas de estômago, para os quais foram receitados "remédios evacuantes", ou seja, clisteres, cuja administração a rainha deplorava. Mais uma vez, por mais atraente que fosse, talvez não fosse a solução mais acertada.
Ser chefe de Estado do vasto Império Português de então enquanto se luta contra surtos de depressão intensa e remédios evacuantes não é fácil. O reinado de Dona Maria I demonstra-o . O seu início em 1777 foi promissor, mas acabou por ter de ser interrompido cedo, em 1792, altura em que o seu filho João, apesar de não ser ainda rei, tomou as rédeas devido ao estado mental da sua mãe. O declínio terá sido súbito, tendo-se deteriorado desde a morte de dois dos seus filhos e de um dos seus netos, todos no mesmo ano de 1788.
Foi a gota de água, e com ela chegaram vários desvarios.
Uma obsessão frequente da rainha nesse período era a sua preocupação com o estado da alma do seu pai: José I.
D. José fora ele próprio uma figura instável, que depois do terramoto de 1755 passou a ser possivelmente o único monarca do mundo que tinha medo de prédios, esses terríveis papões. Mas enquanto foi rei, permitiu também que o seu primeiro secretário, o Marquês de Pombal, perseguisse os jesuítas. Pois Dona Maria I considerava isto uma terrível afronta a homens de fé, e nos seus ataques de melancolia, via alma do seu falecido pai no além, transformada num monte de carvão pelo mal dos seus pecados.
Quando a corte fugiu para o Brasil em 1807, durante a primeira invasão Napoleónica, Maria seguiu com ela. Foi no Convento do Carmo, no Rio de Janeiro, que passou o resto dos seus dias, às vezes em delírio, às vezes feliz com a visita dos netos, sem que nunca se compreendesse ao certo do que sofria nem como lhe dar mais conforto.
Morreu em 1816, e jaz hoje na Basilica da Estrela.